junho 21, 2008

Coisa de infância

Remexendo nas fotos antigas, achei uma com o Xodó. Ele era meu grande companheiro. Enquanto minhas irmãs brincavam de boneca eu brincava sozinho ou com o cachorro. Morava numa casa na rua Martim Francisco, hoje La Place, no Brooklyn em São Paulo, que tinha um bom quintal, onde passei minha infância, até os 11 anos. Depois disso meu pai arranjou uma mudança pra Campinas, onde os trigêmeos nasceram.

Minhas lembranças dos tempos de infância são muito esparsas. Acho que lembro de coisas dos 6 anos em diante. Sempre que volto a esse período, as primeiras imagens que me vem a cabeça são da casa de minha avó, na rua Inglaterra, eu desenhando no chão. Da rua Martim Francisco lembro de coisas a partir dos 7 anos, eu acho. A memória que tenho desse tempo é um pouco carregada de melancolia, uma certa tristeza que ainda hoje não consegui explicar.

Se por um lado a mudança pra Campinas foi boa, por outro foi cheia de perdas. Sim, deixei pra trás uma parte do meu passado que jamais tive contato novamente. Os amigos do primário desapareceram, mesmo sempre os procurando como se estivesse em busca de alguma coisa de um tempo que quase se apagou. Recentemente reencontrei a primeira pessoa que conviveu comigo nessa época, a Anne. Foi emocionante, afinal, faz quase quarenta anos. Antes disso, já tinha encontrado o Mario, que freqüentou a mesma escola pré-primária, mas não tínhamos sido colegas. Nos identificamos por causa das mesas da escola, eram bem diferentes.

Essa coisa perdida, essa sensação de que tive uma infância triste, nunca me deixou. Ao contrário, me fazia querer ter filhos pra compensar a perda. Pensava que poderia recuperar o tempo perdido com os filhos, que poderia viver a infância que não tive através dos filhos. E isso se cumpriu e tem se cumprido a cada dia.

Eu me transformei em criança mais uma vez. Resolvi me jogar no chão com eles, me entregar completamente às emoções da infância. E realizei esse sonho antigo de ter uma infância feliz, cheia de brincadeiras, travessuras e peraltices. Agora tenho novas memórias de infância, ou seriam memórias renovadas de uma infância roubada, que ganhei de volta como presente dos trigêmeos. Eles são esse presente, como um reflexo no espelho, uma reflexão da minha infância no presente. Nada disso seria possível não fosse o imponderável.

P.S.
Acho que eu deveria batizar o imponderável, já que ele se transformou num personagem importante em minha vida. Nelson Rodrigues, ao comentar certas coisas que se achava impossível de acontecer em jogos de futebol, se referia ao ‘Sobrenatural de Almeida’, responsável por acontecimentos inimagináveis. Vou pensar em um bom nome...

4 comentários:

Anônimo disse...

Octavio,
nao e mesmo que revivemos a vida com os filhos? sinto o mesmo....tento tambem "limpar" e consertar algumas coisas.....mas as criancas muitas vezes - por eles mesmo sem comando vao ajudando a gente a re-viver.....
beijos
obrigada pelo seu blog e suas palavras -
mana'

O Lacombe disse...

Mana,
eh muito revival mesmo. E eu ainda relembro quando escrevo aqui.
E essa foto? Deve ser de 68!
Voce eh uma das minhas maiores leitoras. Eu eh que agradeco seus comentarios maravilhosos.
beijao

K disse...

Olá!
Bom, da minha infância eu não tenho do que reclamar. Apesar de não ter irmãos "de sangue", eu curti muito minhas primas e minhas amigas na escola. Meus pais, educadores, sempre tinham um passatempo novo. Nem sei quantas vezes fiz passeios como ir ao Cristo Redentor, pão de açúcar ou zoo. Fora as colônias de férias com os alunos deles.
E, ainda assim, espero corrigir um monte de coisas para as gerações seguintes. Acho que esse é o ciclo, né?

Beijo,

K.

O Lacombe disse...

K,
acho que voce tem razao. Nunca tinha pensado nesses termos, de ciclos familiares.