maio 31, 2009

Vovô Noel [2]

Noel e Maria Augusta viveram 5 anos sem filhos. Coisa incomum para a época. Aproveitaram a vida de casados. Segundo ele, ensinou tudo para a menina Maria Augusta, inclusive cozinhar. Depois, como ditava a norma nos anos 60, tiveram 4 filhos, 3 meninas, Marta, Betina e Maria Augusta e 1 menino, eu. Nessa época Noel trabalhava bastante e não ganhava muito. Uma das histórias que gostava de contar era sobre o nascimento da segunda filha. Não tinham um tostão para pagar o hospital, o parto, nada. E Noel, companheiro de Marioto, freqüentava o Jockey 2 vezes por semana. Maria Augusta protestava em vão, nada o fazia parar com o pequeno vício que lhe consumia as poucas economias. Dias antes do nascimento da menina, Noel tinha 20 dinheiros no bolso e Marioto passa para apanhá-lo para irem ao Jockey. Deixam Maria Augusta em casa aos prantos. Em determinado páreo, Noel quer jogar tudo o que tem no azarão. Marioto diz que é loucura, não deixa, discutem, por fim Noel joga metade do que tem. E o azarão vence o páreo e Noel leva pra casa 3000 vezes o que tinha no bolso, uma pequena fortuna que ele jogou como chuva de dinheiro sobre minha mãe deitada na cama.

Pouco depois montou com o pai e os irmãos uma pequena indústria de componentes automotivos. Associaram-se a companhias estrangeiras. O negócio prosperou. Noel trabalhava bastante. Chegava tarde ao escritório e tarde em casa. Uma das fortes lembranças de minha infância é ser proibido de fazer barulho de manhã. E à noite mal via meu pai pois já estava na hora de ir pra cama. No início dos anos 70 transferiram a fábrica para Campinas, mas num revés de uma negociação duvidosa, perderam tudo para os gringos. A depressão de Noel foi compensada por sua oficina de marcenaria, seu hooby e pela chácara que comprara quando mudou com a família para Campinas. Acho que isso o salvou de uma crise maior do que aquela que enfrentou. Enfim, refez sua vida profissional e trabalhou por anos na mesma empresa.

Era um cara difícil, pelo menos com os filhos. Distante, calado. Com os outros, nas reuniões sociais, entre amigos, era o que se pode chamar de animador de festas. Contava piadas e muito bem. Conseguia prender a atenção das pessoas por horas a fio contando piadas. Entretanto, era um cara carinhoso, gostava de fazer carinho, de ficar abraçado com os filhos, especialmente com as filhas. Noel era daqueles caras que não gostava de crianças mas que os tiveram porque contavam com o trabalho da mulher em casa para criá-los. Ele sempre afirmou que não gostava de crianças. E não gostava mesmo. A idade limite para ele era 14 anos, por aí.

Noel completaria hoje 83 anos. Nos deixou em 1993, aos 66 anos. Não chegou a conhecer nenhum dos netos. O primeiro, Guilherme, nasceu no ano seguinte de sua morte. Não sei como ele seria como avô. Talvez se dobrasse aos encantos desses pequenos seres, difícil saber. De todo o modo, meus filhos sabem bem quem foi o vovô Noel. Ele vive em nossas memórias e faz parte da história desses trigêmeos. Um avô sempre faz falta.

[Eu tinha uma foto muito bonita de meus pais juntos, mas não a encontrei. Não sei como pude perdê-la, estava guardada junto com todas as outras fotos mas não está mais lá. Se um dia a encontrar, coloco aqui.]

Um comentário:

Alê disse...

Ah, Octávio, que pena que não deu tempo dele conhecer os netos.Tenho certeza que ele iria começar a gostar de crianças a partir do nascimento dos netos.Já ouvi estórias assim, de pessoas que não gostavam de crianças,mas qdo os netos nascem....Nasce uma nova forma de reviver a maternidade e a paternidade como um "acúcar" mágico!Não dizem que avós são mães e pais com açúcar????
E vô faz MUITA falta mesmo.Eu sei bem disso.....Que bom que vc introduziu a presença, mesmo que ausente do seu papai Noel na vida dos fofuchos!
Beijos